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sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Dedicatória


Foto: Dina Oliveira


(E)Terna Saudade

Paula Sofia Erse Arruda era uma mulher de múltiplas facetas. Inventava e reinventava-se constantemente, tendência manifestada desde logo no tratamento que deu ao próprio nome. Muito cedo, aboliu o “Paula”. Quanto ao “Erse”, usava-o apenas quando sentia necessidade de um não-sei-quê na sua vida.
A esmagadora maioria dos que a conheceram e amaram tinha-a, assim, como Sofia Arruda. Nasceu a 5 de Junho de 1968 e morreu a 19 de Novembro de 2003, aos 35 anos de idade. Ao contrário de muitos momentos da vida que a foram gastando, entre contras, escolheu a hora e o selo da sua própria morte.
Não há que julgar. Todos temos direito a dizer “basta”. A Sofia Arruda cortou o vento da noite quando decidiu despedir-se, de si e de nós. Mas talvez tenha sido apenas o fechar de um círculo, já que a sua vida foi “um vendaval que se levantou”. Incompreendida por muitos, desprezada por outros, foi – e é – alguém capaz de tatuar-se na pele das pessoas que a foram rodeando. Irmanava-se com os marginais e os infelizes, porque sabia que dar-lhes um sorriso ou um beijo podia fazer toda a diferença.
Detestava a preguiça e a incompetência alheias, torturando-se sempre que caía nos mesmos erros que criticava em terceiros. Era uma exímia “apagadora de fogos”. Mas era também um fulgurante incêndio. Admirava os talentosos, muitas vezes sem perceber que fazia, ela própria, parte desse universo.
Tinha arte, música, cinema e teatro na alma. Tinha obras completas nas mãos, construindo actos toscos – mas inesquecíveis - de amor. Deixava-se marcar. E era marcante, nas relações pessoais e profissionais. Passou pelo glamour da publicidade, da imprensa e da comunicação. E passou também pelo acartar de caixotes e pela muda de fralda a idosos, quando precisou. Dizia que não era por empregos menos nobres que lhe cairiam os parentes na lama.
Adorava música de dança, noitadas, vodka, relógios, cães, crianças, desafios informáticos, viagens, revistas de curiosidades, biografias, cusquices, areia nos pés, cafés e sumo de morango. Surpreendia-nos quando cumprimentava celebridades na rua e recebia, em troca, os olás e beijos e abraços mais efusivos. Conhecia meio mundo e trancava a sete chaves os seus segredos mais profundos e cabeludos, de dia e nas noites. Dizia que as figuras públicas tinham sido, em tempos, pessoas normais como ela; e que nunca se esqueciam disso.
Era uma mulher de conceitos originais e frases feitas. Quando tropeçava no chão da vida, levanta-se tão depressa quanto podia, verbalizando o seu “siga a marinha que o exército está cansado”. Confrontada com a possível obrigação de fazer algo com que não concordasse, desviava caminho com um apressado “era a primeira bola a sair do saco”! Não sendo conflituosa, sempre que se sentia acossada dava um aviso, tentando não ser forçada a atacar: “ai, que temos a burra nas couves…”
Sabia exactamente quando usar o francês, o inglês, o espanhol ou o italiano para reforçar um momento ou uma ideia. Era certeiramente oportuna quando estava alerta, mas igualmente inocente e ingénua quando deixava cair as máscaras. Ao longo da vida, usou muitas.
Era uma mentirosa quase compulsiva, mas nem aí a sua alma deixava de ser doce. As suas mentiras raramente funcionavam como armas de agressão ou de defesa pessoal. Eram tão-somente a forma infantil com que optava por defender os outros de si mesma - e dos seus deslizes.
Fez-se pedra dura no contacto com todos os muitos que a quiseram quebrar, com tantos aqueles que lhe tentavam, quase sempre sem sucesso, consumir a alegria. Tinha medo de se tornar um peso para os outros.
Sólida como as rochas na descoberta de soluções para os problemas e dramas alheios, não era capaz - estranhamente - de fazer o mesmo por si. Ajudava nas sombras. Não queria méritos. Escondia a sua timidez e insegurança avassaladoras numa personalidade extrovertida, excêntrica e até, por vezes, inconveniente.
Tinha horror ao politicamente correcto, fugindo a sete pés da normalidade da carneirada social. No limite, não tinha qualidades nem defeitos. Tinha apenas características, únicas e irrepetíveis, capazes de fazer dela a Sofia. A nossa Sofia. A minha Sofia.


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